A Blitz From The 80's

Sábado, 10 da manhã.

Mais uma vez, estamos em Sintra, e o largo onde iniciámos a sessão ao Clio RS do Luís é o nosso ponto de encontro. Desta vez, aguarda-nos algo mais vintage, um Opel Corsa A GT de 1987 e o seu proprietário, o João, um dos amigos da Photorevvin', membro do distinto Opel Classic Racers e companheiro habitual em deslocações ao autódromo do Estoril.

Aproximamo-nos dos dois e damos com o João a dar os retoques finais para preparar o carro para esta sessão. Adoramos um projecto bem feito de A a Z, mas este GT está quase completamente de origem e isso agrada-nos, tendo em conta os quase 30 anos de idade deste exemplar.

Passados os cumprimentos da praxe, estamos prontos para seguir em direcção ao Cabo da Roca, ou assim pensávamos nós...

“João, não ias trazer os centros das jantes?"

"Eu sabia que me tinha esquecido de alguma coisa! Importam-se que vá num instante a casa buscar isso? Demoro 15 minutos, por aí."

"Vai lá, nós esperamos.”

Aproveitamos para tomar um pequeno-almoço reforçado, enquanto o Corsa não volta com os centros devidamente colocados. É que as jantes de origem do GT, da autoria da Ronal, ainda hoje apresentam um desenho muito curioso, mas para quê fotografá-las a 90% do seu encanto quando podemos fotografar a 100%?

O João e o Corsa regressam, e agora sim, estamos a postos. Vamos ver se não comemos a mais para uma volta mais animada pela Lagoa Azul.

Chegados ao Cabo da Roca, depois de enfrentar um autêntico enxame de ciclistas (vá, passámos por um Ferrari F430, também...), o nosso plano inicial cai por terra. A quantidade de movimento e de turistas impede-nos de tirar algumas fotos. É que nem tentámos, não valia a pena, de todo.

Que chatice, as curvinhas que deixámos para trás vão ser feitas no sentido oposto.

Tentemos tirar o Corsa dos espelhos, então.

Serra de Sintra comes to the rescue...

Ainda andamos durante algum tempo em busca de um novo spot, enquanto pensamos em alternativas no camera car. Já quase a atirar a toalha ao chão, encontramos um local que nos agrada, a caminho do Santuário da Peninha.

Está escolhido!

“João, põe o carro entre aquelas árvores, acredita que vai valer a pena!”

O bom de se manter uma altura de origem num carro é esta, maior versatilidade.

O Corsa progride sem queixumes, aparte de ir abaixo com alguma regularidade, fruto da alimentação a carburador e da passagem em ritmo rápido pela Lagoa Azul. Um pequeno desportivo que não gosta assim tanto de ser abusado. Aqui para nós que ninguém nos ouve, parece-nos falta de hábito.

João, quando é que isto vem passar uns dias com os tipos da Photorevvin', mesmo?

As fotografias vão surgindo, com o bom estado geral do quase trintão a ajudar e muito à inspiração para novos enquadramentos.

Bem, o dono também dá uma ajuda, quando junta à conversa histórias de enganar jovens aceleras com peças de alto calibre como os pneus digitais, que fazem qualquer Citroen Saxo curvar como se fosse um Fórmula 1 (mas atenção, têm que ser encomendados tendo em conta a cor do carro, caso contrário não funcionam) ou as velas orgânicas, que possuem um elemento natural qualquer que acrescenta potência ao motor. E houve quem efectivamente tivesse pago por tão miraculosas peças, o que nos faz soltar uma gargalhada ainda maior.

Enquanto se fotografa o interior estimadíssimo, perguntamos ao João se pode ligar o rádio.

“Tens aí música de jeito?"

"Tenho muito Metal, mas espera, posso ter aqui uma coisa que vos agrade."

(Surge “Initial D” no display do rádio)

"ESTÁ BOM, NÃO MEXAS MAIS!”

A música de facto não tem muito a ver com as origens do carro, mas estamos numa serra, pelo que não está completamente fora do contexto. E ajuda a animar um ambiente já de si galhofeiro, como só os homens sabem criar. Mas o facto de estarmos em idades semelhantes também é parte da explicação.

Voltando ao Corsa, entre fotos, sentamo-nos um pouco dentro do carro, e é como se tivéssemos entrado numa máquina do tempo. Os plásticos de há 30 anos, para dois jovens que possuem carros modernos, fazem confusão, mas por outro lado, relembram-nos os respectivos primeiros carros, pouco mais recentes que este GT.

Muito mudou nos automóveis em três décadas, de facto, mas poder constatar ao vivo o apreço que um rapaz da nossa geração tem por um carro em vésperas de se tornar oficialmente um clássico entusiasma-nos e faz-nos pensar que, embora sigamos algumas modas que não temos a certeza se serão de futuro, caso do stance, ainda existem pessoas que, embora jovens, só querem estimar o melhor que podem (e conseguem), os seus carros, tal como os respectivos fabricantes os idealizaram.

E, nesta cultura do individualismo, do ênfase no “ao meu gosto”, esta é uma opção tão legítima como fora do comum.

Sair dos bancos traseiros do Corsa, ou nascer, não devem ser experiências muito diferentes no que toca à quantidade de espaço disponível. Mas o carro não é acanhado em termos de habitabilidade, não terrivelmente, pelo menos. Nós é que estamos mal habituados com os carros modernos. Mesmo os mais pequenos tornaram-se terrivelmente obesos (em vários sentidos) quando comparados com os seus antecessores. Fazem falta mais carros pequenos nas nossas estradas. Este Corsa... tem o tamanho suficiente, e deixa-nos algo tristes pensar que estes compactos dos anos 80 e 90 estão a desaparecer a um ritmo frenético das nossas estradas.

Está a perder-se uma geração de carros com os quais crescemos, e cujos exemplares sobreviventes mais cedo ou mais tarde começarão a fazer parte de uma bolha de especulação, impedindo assim alguns interessados de os adquirirem.

João, faças o que fizeres, mantém o GT contigo, o carro precisa de um dono assim. “Ain't nothing like the old-school”, de facto.

Desta vez não houve almoço, algo que gostamos sempre de combinar com os donos dos carros que fotografamos. Mas fica para outro dia, no próximo encontro que tivermos com este Opel.

Da parte da Photorevvin', fica o nosso Até já!

E um obrigado, por nos teres dado o privilégio de passar parte do dia com o teu Blitz from the 80's.